Após as boas-vindas das Presidentes da Direção das entidades coorganizadores do evento, Dra. Patrícia Cavaco, Presidente da APFH e Dra. Olga Delgado Sánchez, Presidente da SEFH, deu-se início a um fórum de atualização e partilha de experiências entre Farmacêuticos Hospitalares portugueses e espanhóis.
Na primeira sessão, moderada pelo Vice-Presidente da SEFH, Dr. Jordi Nicolás Picó, foram discutidas as recentes mudanças no contexto regulamentar europeu, introduzidas pela nova diretiva e regulamento da Comissão Europeia, propostos a 26 de abril de 2023. Os principais desafios, segundo o Diretor-Geral da CarteraComún de Serviços do SNS espanhol, Dr. César Hernández, são a equidade, a sustentabilidade (especificamente na área de imunooncologia), o acesso e o real-worldevidence. A reforma da legislação farmacêutica, focada na efetividade, segurança e qualidade, tem como principais objetivos estabelecer regras e critérios harmonizados que permitam promover a inovação, a investigação clínica, a transformação digital e a sustentabilidade ecológica, facilitar o acesso, diminuir a escassez e as resistências antimicrobianas, aumentar a transparência e garantir a equidade.
No domínio da avaliação de tecnologias da saúde, o Dr. Rui Santos Ivo, Presidente do Conselho Diretivo do INFARMED, I.P. e da Rede Europeia de Avaliação de Tecnologias da Saúde (EUnetHTA) levou à discussão o trabalho desenvolvido a nível europeu que possibilitou as novas regras relacionadas com a cooperação dos Estados-Membros na realização dos relatórios de avaliação clínica conjunta.
O ecossistema regulamentar anterior à publicação do Regulamento (EU) 2021/2282 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 2021, era heterogéneo e graças às novas regras e metodologias comuns, a análise comparativa dos aspetos farmacoterapêuticos e farmacoeconómicos será mais eficiente, contribuindo para melhorar a acessibilidade e a sustentabilidade.
Foi enfatizada a necessidade de preparação adequada por parte das autoridades nacionais. Cada Estado-Membro continuará a ser responsável pelas condições de acesso e preços praticados a nível nacional.
Foi destacado que, até o final de 2025, serão emitidos os primeiros relatórios de avaliação clínica conjunta de medicamentos oncológicos e medicamentos avançados de terapias avançadas (ATMPs), até o final de 2028 de medicamentos órfãos e a partir de 2030 qualquer molécula passará por este procedimento.
Em relação ao Real-Worldevidence, foram discutidos os tipos e fontes de dados, a sua importância no contexto da prestação de cuidados de saúde e a necessidade de criar medidas para os proteger. Foram mencionados os diversos tipos de dados, como dados clínicos, dados relacionados com os medicamentos, com as prescrições, com os custos e utilização, dados do perfil molecular e da história familiar, dados ambientais, dados provenientes dos PROM’s (Patient-ReportedOutcomeMeasures), das redes sociais, da saúde digital e da literatura e ainda os dados de saúde pública. O Real-WorldEvidence foi apresentado como uma ferramenta para preencher a lacuna entre a investigação e a prática clínica, pela possibilidade de fornecer informações sobre o que realmente acontece em termos de benefício e risco quando os doentes são tratados fora dos ambientes controlados dos ensaios clínicos. A avaliação, validação e agregação destes dados a partir das várias fontes disponíveis proporciona muitos benefícios para o ecossistema de saúde, quer a nível de segurança, efetividade e valor do medicamento aprovado, quer ao nível da utilização off-label.
Foram mencionados os desafios da Real-WorldEvidence, nomeadamente a qualidade e privacidade dos dados, tratamento estatístico e inteligência artificial, reprodutibilidade, diversidade, equidade, transparência e familiaridade com os métodos de análise para a correta interpretação. Segundo o Professor Doutor João Paulo Cruz, Diretor do Serviço de Gestão Técnico-Farmacêutica do maior hospital português, o acesso aos dados não é o que mais importa, mas sim a formação, no sentido de saber como os trabalhar. Sendo o primeiro ponto de contacto com o doente, os farmacêuticos hospitalares têm um papel fundamental na prestação e recolha de informação, na identificação de problemas de segurança, na avaliação dos tratamentos e no entendimento dos fatores que influenciam a utilização e adesão à terapêutica. Para que tal seja possível, os farmacêuticos devem estar familiarizados com os robustos métodos e procedimentos que garantem a qualidade e a validade do real-worldevidence, nomeadamente no que respeita aos registos e análise dos dados.
O Fórum prosseguiu com temas clínicos, tendo a Dra. Patrícia Cavaco e a Dra. Maria Elena Lobato Matilla ressaltado a importância do acompanhamento do Farmacêutico Hospitalar nas doenças oncológicas e autoimunes. A presença do farmacêutico hospitalar na equipa multidisciplinar oferece benefícios significativos, relacionados com a efetividade dos tratamentos, com o aumento das taxas de remissão e com a melhoria da qualidade percebida pelos doentes. Um dos tópicos discutidos foi a relevância da consulta farmacêutica, que proporciona um ambiente propício para a avaliação individualizada dos doentes, para a estratificação de riscos e identificação de necessidades específicas. Com base nas características individuais de cada doente, é possível direcionar as intervenções terapêuticas de forma mais precisa, maximizando os benefícios e minimizando os riscos.
Durante o fórum, também foi destacado o papel dos PROMs (PatientReportedOutcomeMeasures) e das novas tecnologias (como as apps) na monitorização e recolha dos dados relevantes sobre a efetividade dos tratamentos. Estas ferramentas permitem que os doentes participem ativamente na jornada da sua doença, fornecendo informações valiosas sobre os resultados clínicos, qualidade de vida e adesão à terapêutica. A utilização das tecnologias foi enfatizada como uma forma de promover a inovação, melhorar a comunicação entre e com os profissionais de saúde e otimizar os resultados clínicos. Outro aspeto abordado foi a importância de se considerar o custo por doente em cada região e em cada país, como forma de avaliar a eficiência dos processos implementados (como é exemplo, a consulta farmacêutica) e a utilização adequada dos recursos disponíveis. O farmacêutico hospitalar desempenha um papel fundamental na análise dos custos relacionados com os medicamentos, na pesquisa de alternativas terapêuticas que sejam mais acessíveis e igualmente eficazes e no fornecimento de informações claras e precisas aos doentes, capacitando-os a tomar decisões informadas sobre sua saúde e promovendo a adesão ao tratamento.
Em relação aos novos ensaios clínicos, a Dra. Florbela Braga e a Dra. MaríaPerayreBadía partilharam a experiência dos seus centros. A intervenção farmacêutica nos ensaios clínicos de fase 1 foi um tema amplamente discutido durante este Fórum.
Algumas das responsabilidades do farmacêutico hospitalar consistem em realizar o screening dos doentes, efetuar a revisão da medicação concomitante e validar se tudo se encontra a decorrer de acordo com o protocolo, o plano de tratamento e os parâmetros e características estabelecidos. Para além disso, no caso de medicamentos administrados por via oral, o farmacêutico pode realizar a dispensa direta ao doente, fornecendo as orientações necessárias para a sua correta utilização. A educação ao doente é outro aspeto importante, sendo que o farmacêutico deve fornecer informações detalhadas na primeira visita, aquando do início do tratamento. Nas visitas seguintes, o farmacêutico está envolvido em atividades como o ajuste de dose ou o esclarecimento de dúvidas. O acompanhamento telefónico é uma estratégia utilizada em esquemas terapêuticos complexos ou quando as formas farmacêuticas não são convenientes para o doente, possibilitando o seguimento de forma mais intensiva. Para além disso, o farmacêutico é responsável pela devolução e registo dos medicamentos orais não utilizados pelos doentes, bem como pela avaliação da adesão à terapêutica em todos os medicamentos orais prescritos.
O envolvimento ativo do farmacêutico hospitalar nos ensaios clínicos é fundamental para garantir a segurança, a eficácia e a conformidade com os protocolos estabelecidos, contribuindo para o avanço da investigação clínica e para o desenvolvimento de novos tratamentos.
O Dr. Juan Polledo, em representação do patrocinador do evento, concluiu a manhã de trabalhos sumarizando que embora o código postal do doente tome atualmente mais decisões que o código genético, daqui em diante as decisões devem ser tomadas de acordo com os dados. Referiu ainda que a única coisa que pode substituir os algoritmos é o diálogo de qualidade entre partes que pretendem atingir o mesmo objetivo. A Direção de ambas as entidades coorganizadoras (APFH & SEFH), na voz da Dra. Patrícia Cavaco e Dr. Jordi Nicolás Picó e destacou também o papel da humanização dos cuidados de saúde numa era tomada pela inteligência artificial e pelos dados.
O Fórum Ibérico proporcionou ainda uma plataforma de discussão enriquecedora sobre a integração do farmacêutico hospitalar nos serviços de urgência, sobre o futuro da farmacocinética e sobre a residência farmacêutica, temas que foram debatidos em três workshops onde os farmacêuticos hospitalares de ambos os países trocaram experiências práticas.
Nesta 2ª Edição, o Fórum Ibérico impulsionou a prática clínica dos farmacêuticos hospitalares de ambos os países, revelando ser um espaço com o potencial de aperfeiçoar o exercício da profissão, promover o avanço da farmácia hospitalar, fomentar relações entre pares a nível nacional e internacional e melhorar os resultados clínicos e a qualidade de vida dos doentes.